quinta-feira, agosto 30, 2007

Como decidi virar bibliotecário!?

Essa é uma pergunta que eu ouço quase que diariamente faz quatro anos e meio. Sempre invento um motivo, um diferente, mais adequado a cada situação, obviamente. Pro pai eu falei que era uma profissão estável, rentável e divertida (vocês acham que ele ia comprar só aquela idéia de estável?), subretudo divertida (;p). Pra namorada/pretê/rolo/ ”o que for” falava que era pra ajudar a humanidade, salvar as pessoas da ignorância. Pros amigos falava “tem um monte de mulher de óculos em biblioteca, adoro mulher de óculos, tu ta ligado né!?”, isso já bastava. Mas a verdade esteve escondida até agora. Vou contar logo o porque, quem sabe assim param de me interrogar.

Numa tarde chuvosa, tinha a missão de ir levar qualquer coisa no centro, não sei pra quem. Pois enrolei o que pude, mas acabei forçado a cumprir a missão. Saí da Santos Seguradora na av. Paulista, tomei um ônibus na Consolação e cheguei à Republica com o Sol já se escondendo entre os prédios. Estava calor e o asfalto dourado com o reflexo dos últimos raios de Sol daquela abafada tarde de primavera. Entreguei/busquei o que quer que seja e resolvi voltar à Paulista andando. Não sei o que pretendia na Paulista e nem sei ao certo se não era a 9 de Julho o meu caminho, mas fui. Numa daquelas ruas próximas à 13 de Maio , ou AL. Ribeirão Preto, sei lá, vi uma porta do que parecia uma pequena vila. Era uma portinha de nada e dava pra um corredor longo e cheio de barulhos estranhos, luzes. Resolvi num súbito que eu precisava saber o que se passava por ali e entrei.

Era um muro longo e um portão de ferro, daquelas de bar, com um toldo em cima, do lado dele a porta, de madeira, pintada de verde, aberta o suficiente pra eu me picar pra dentro sem mesmo tocá-la. Assim que entrei cruzei com um senhor, velho já, com calças azuis e um jaleco imundo de tudo. Cruzou por mim sem mesmo notar-me, saiu e fechou a porta. Olhei atentamente pra me certificar que ele não trancaria, não trancou. Quando me virei me vi envolto naquele lugar. Um longo corredor com centenas de portas. Talvez houvesse até corredores paralelos, ou que se cruzassem, sei lá. Não cheguei a ter a chance de notar. Ví que no final do corredor, uns 200 metros de terreno sinuoso adiante, que havia uma outra porta, que com ajuda de Deus haveria de estar aberta.

Então me pus pra andar. Depois de uma ou duas portas, uma aberta, um senhor de calças e sem camisa está sentado contemplando os pés mastigados pela bota que está ao lado, uma cena tocante, de verdade, quase uma foto do Sebastião Salgado, mas a única coisa meio artificial na cena era eu mesmo, meio deslocado daquele mundo dos cortiços do Bexiga. Na próxima porta, que passei tão rapidamente quanto da primeira, sem mesmo dinimuir ou vacilar o passo, vi nessa uma menina ruiva muito jovem, olhando para um relógio, angustiada com alguma coisa, sentada no lençol de grandes e coloridas flores vermelhas que cobria sua pequena cama. No próximo quarto uma janela aberta, um gordo de bigode coloca o cinto e o colete jeans enquanto uma moça chora ruidosamente deitada numa cama.

Isso aumenta a urgência em sair de lá, e eu apertei o passo pra poder ligar pra polícia, ou alguém. Mesmo assim não queria deixar de olhar as outras portas e janelas pelo caminho. A maioria tinha TVs ligadas na novela ou em algum telejornal e pessoas num sofá. Até que eu vejo numa fresta de porta, uma daquelas de alumínio, simplesinha, olho com mais atenção e vejo uma mulher loira, a princípio não conseguia ver mas era muito bonita, toda ela. Estava vestindo um espartilho branco, grandes luvas brancas e o cabelo estava preso com uma tiara, que tinha um véu preso nela. Essa mulher então estica o braço e pega um buquê de lírios, ela está diante de um espelho e se olha atenta, mas tranqüilamente. Em seguida lança o buquê pra trás, na cama, e pega o que parece um grande o luxuoso vestido de noiva. Ela aperta o vestido contra o peito, endireita o cabelo e em seguida o vestido sobre os ombros. Está linda, altiva, completamente dissonante da parede azul desbotada e dos móveis simples ao seu redor, da vila inteira. Ela estava linda, não perdia pra nenhuma noiva da Nossa Senhora do Brasil dos últimos anos, pelo menos não pras que saíram na Caras. Então pelo reflexo no espelho ela me viu parado à sua porta, se virou rapidamente. Quase caí pra trás de susto! Ela veio até a porta, no caminho pegou um papel numa cômoda e ao chegar à porta ela me entregou, era um cartão de visitas, seu nome e logo abaixo “acompanhante”.

Enquanto eu olhava o cartão ela dizia sorridente: “passa outra hora, hoje eu to de folga”. Ela já ia fechar a porta na minha cara quando coloquei a mão parando-a. Quando percebi o que se passava à minha frente, uma “acompanhante” sonhando ao espelho com um casamento que não aconteceu, parei a porta e resolvi tentar puxar assunto. Não sabendo direito o que falar eu lancei o que apareceu a língua: “Você fica linda de noiva, mas você não acha que o seu trampo é a prova cabal que o casamento já nasce falido?” E ela respondeu um tanto mais cisuda: “Você é um bibliotecário por acaso?” Perguntei “por que?” e ela me disse “porque só um bibliotecário ia me ver de lingerie e vir com um papo besta desses”. Hahahahahahaha!!!!!!!! Não, ela não falou nada disso, acabei de inventar.

Na verdade ela disse: “porque só um bibliotecário pra entender o que acontece dentro de mim quando eu me vejo vestida assim”. Minha mão caiu e ela conseguiu fechar a porta. Então um monte de sensações me acometeram ao mesmo tempo, e pensei naquilo até o final do corredor, e depois até o final do corredor da Santo Amaro e até em casa. A sabedoria, não toda ela, não aquela que vai mudar a história da física, mas aquele que as pessoas sentem, pode parecer uma pretensão estúpida querer entender o que as pessoas sentem, querer saber o que as pessoas querem e temem, e se possível colocar no papel. Era aquilo que eu queria, a sabedoria de entender o que as pessoas sentem, escrever com a alma, de quem conhece a escrita, e as almas. Eu quis ser um bibliotecário pra traduzir as almas, e “fornecer acesso” a elas com o que eu escrevo.

Eu resolvi ser bibliotecário por causa de uma puta vestida de noiva.


Ouvindo:
Archers of loaf – You and me, sicklife, wrong, might.

quarta-feira, agosto 15, 2007

Sorte grande

Durante caminhada pelas ruas de Salvador, Jutahy Magalhães (1929-2000), pai do deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA), foi abordado por um homem aparentemente embriagado, que de pronto o reconheceu:
-Ô, senador, me dá uma ajuda aí!
Magalhães tirou um trocado do bolso e entregou ao homem, não sem antes recomendar:
-Vê se não vai gastar em bebida, hein?
O homem contou o dinheiro escasso, olhou para Magalhães e ainda conseguiu ser irônico:
-Pode ir embora tranqüilo, senador. Com tudo isso aqui eu acho que vou comprar é uma casa!

Ouvindo:
Toy Dolls - Keith's a thief.

quarta-feira, agosto 08, 2007

Sou feinho, mas faço sucesso no Japão! Não só eu!

Na última atualização do contador deste blog eis que noto a presença de um leitor do Japão!! Tenho amigos lá, até uma ex-sogra, mas nunca tinha recebido visitas da terra do zói pequeno. Não sei se é só um mesmo ou mais (de 1 a 10 leitores conta apenas como 1), mas eu sei que tenho colegas lá, pessoas com um interesse comum, que acreditam num mundo melhor, com mais Lealdade, Humildade, Procedimento. Eu estou falando da Torcida Corintiana no Japão, que a cerca de um mês atrás organizou um ato "Fora Dualib"!!!! rsrss...

Antes a gente falava que tinha corintiano pelo Brasil inteiro, bem, acho que vamos ter que refazer essa frase!




Seguindo firmemente em busca de uma diretoria honesta e do milésimo leitor!!! rsrss... talvez até no Japão!

Ouvindo:

House of Pain - shamrocks & shenanigans

terça-feira, agosto 07, 2007

Passageiro

Tem sempre alguém indo embora, morar em São Paulo é sempre assim, sempre tem algo acontecendo, e tudo influi na tua vida, uma hora ou outra, desde uma briga de transito, um velhinho passando mal na rua ou um avião sem freio que entra num posto de gasolina. Nas últimas semanas vi muita gente ir embora, alguns pela primeira vez, alguns que estavam só de passagem, outras se foram pra sempre. A vida nessa metrópole vem se tornando mais complicada a cada dia, pois ao passo que um vai embora, chegam cinco, pelo Tietê, por Congonhas, Cumbica no PS do Grajaú ou pelo Sírio Libanês. E o jeito é ir se apertando, se acostumando, pois não há nada que se possa fazer a respeito, definitivamente. O telefone se transforma num paliativo, um abraço digital, o computador é o portão, a janela, aberta das 9h às 16h e eventualmente aos finais de semana.

Vejo da minha janela, a de casa, as pessoas passando apressadas, de lá pra além, com casacos grossos e olhando para o chão, incomunicáveis, numa urgência que só vendo. Agora entendo o Chico Buarque quando ele disse que no Rio todos se sentem como artistas, mas em São Paulo todos, mesmo os artistas como ele se sentem como operários, parte de uma massa cinza, indistinta, correndo entre os prédios espelhados e as pichações desvendadas pela lei Cidade Limpa. E as pessoas se vão, correm por seus destinos, se desvencilham da grandeza viciante da cidade das chuvas geladas, no medo de topar com os frutos da nossa própria pressa e desatenção.

Com o tempo nos acostumamos a dar adeus, a ver as pessoas partindo e levando partes nossas mesmo a contragosto, vemos acontecer e ficamos assim, meio cão sem dono, por um tempo, cada vez menos tempo, até que não nos damos ao trabalho nem de ir até a rodoviária, ou até a porta. Pensar no que foi feito de errado é um desperdício, depois de feito não adianta mais, mas não nos furtamos a fazê-lo, em vão, já que as respostas são quase sempre inconclusivas, e perguntar pode ser ainda pior, pois a resposta dificilmente fará bem.

Sentir-se desesperadamente só numa noite fria não é um privilégio aqui, abraçar é, cantar e se olhar no espelho limpo de si, esquecer um pouco da doença e do medo, tentar se livrar desse jogo morto, do gerenciamento de performance, das notas, de devolver aquele cotidiano do qual se arrependeu em não ter conquistado, pois agora vê, e só agora, que também gosta de como isso soa.

E te sentes condenado por esta sorte do avesso, esse sentimento blindado de costelas a vibrar, depois de tanto íntimo depois tremer ao falar, não conseguir falar, fugir disso, como no dia do apagão, como na hora da valsa, da chuva e da festa, um pouco pior agora, com vergonha, com tanta dela, agora sem conseguir se ser, se estar, se permanecer, mas só se continuar, num fio cada vez mais tímido de ser, de sentir.

Cada vez mais isso me parece tolo.

Ouvindo:
Norah Jones – Rosie’s lullaby
Belle & Sebastian – This is Just a modern rock song

MDH: Preciso recuperar o “do it yourself” que existiu em mim.