sábado, março 27, 2010

Aprendendo com a Nigéria.

Já não sei mais o que deveria ser. Quer dizer, até sei, mas acho pretensioso, “o que deveria ser” pela visão de um cara que pouco leu, pouco sabe... raso. Apesar de saber disso ligo pouco, dou minha opinião por aí e irrito, insulto, atrapalho o status quo dos mothingmakers de plantão. Gosto de reclamar da minha insignificância e me deprimo facilmente com a minha incapacidade de mudar as coisas do mundo que acho erradas, com as coisas da minha vida que acho erradas, com o ambiente urbano, as relações de trabalho, com os serviços recebidos e prestados, com a relação que tenho com os mestres, os aprendizes, os colegas, os desconhecidos. Só não me desespero com o desconhecido porque sei que ainda poderei conhece-lo, ou não. Estou numa fase de urgências, de trocas intensas, de embates violentos. Não sou violento, sou intenso em mim e penso tão cíclico que não sobra muito pra por pra fora. Um eterno incompleto, um eterno se conhecer, conhecer o mundo e se saber incompleto.

Sei-me incompleto desde cedo, não quero perder tempo e troco raivoso, frustrado, imaginando que não chegarei a ponto de saber o suficiente para transmitir, para ensinar. Sou um bibliotecário de referencia, tento sê-lo. Estou aprendendo todos os dias sobre novas fontes, novos conceitos, novas abordagens, todos os dias estou mais próximo do cinema, de sua busca incessante por criar um metamundo fantástico, onde as emoções são mais intensas, as idéias factíveis, onde o impossível se materializa à sua frente e onde por cerca de duas horas você estará imerso num outro mundo.

Outro dia um professor disse que nós (alunos da USP) somos todos elitistas, que não olhamos para a periferia, não vemos as massas. Eu entendo o lado dele, a visão dele, e eu sei que ele tá mesmo certo. O que eu faço no meu trabalho? Faço o meu melhor, sim, para quem chegar aqui e me perguntar, sim, mas quem vem é a bourgeoisie, salvo alguns poucos guerreiros aqui e ali. E o cinema da periferia? E a voz da periferia? Estava lendo agora sobre o cinema nigeriano e o seu quase do it yourself, eles fazem um cinema original, com histórias baseadas nas histórias deles próprios, do povo, contadas com produções gambiarradas e distribuídas em DVD para todo o continente a um preço/custo baixo, de uma forma sustentável. O cinema nacional da nigéria é um sucesso em toda a África, sucesso econômico e cultural, sucesso de público. Mas a qualidade técnica é ruim? Ninguém lá ta atrás de Oscares e Leões de Prata, eles querem contar histórias. Mas os roteiros são fracos e as histórias vulgares? Foda-se, é o cinema que as pessoas querem ver, finais felizes e seus cenários do dia-a-dia retratados na tela, sua realidade fantasiada e mistificada passando na tela, é isso que eles têm e que nós aqui não temos, um cinema que se pague, que fale às pessoas, que as toque, que as represente no mundo fantástico, que filme brasileiro representa o povão, o vida-loca, o evangélico trabalhador, o bóia-fria putanheiro, a doméstica com quatro filhos? Não é à toa que o maior sucesso da história do cinema nacional é “A dama da lotação”, isso faz mais de 30 anos e ninguém percebeu ainda que deixar na mão dos riquinhos da ECA e da FAAP a missão de contar pro mundo quem somos nós e o que é ser brasileiro, quem é o brasileiro e como a gente mata um Leão de sete cabeças por dia, nem sempre rindo e sambando como acreditam nossos queridos diretores do Leblon e dos Jardins.

A gente tem mania de achar que tudo no Brasil é difícil, que não é pra nós, que não temos capacidade, possibilidade, que vamos passar vergonha se mesmo tentarmos... a Nigéria está aí mostrando que esse problema de auto-estima pode ser superado, e eles estão contando sua história e estão vivendo disso. Quando vamos fazer o mesmo?

3 comentários:

Anônimo disse...

Bem vindo! Como nos velhos tempos... Eu estava com fome e me alimentei dos seus caracteres como qualquer brasileiro não contemplado pelo fome zero o faria.

Anônimo disse...

Podemos mudar os conceitos.
Basta acreditarmos em novos horizontes, assim como você!
Continue escrevendo, seus textos são únicos.

Polinha disse...

qdo?
qdo toda a critica for exercitada em primeira pessoa.