sexta-feira, março 21, 2008

Limonada Suissa II

“Trinta e sete, foda-se, vou pra rua.“
Me vesti, saí. No terminal de ônibus o telefone “não é você que gosta de Pixies?”. “É, se tem alguém que gosta sou eu.” “Você sabe de Curitiba né? Vai ter show, mas não vai ter ingresso?” Que porra é essa? Odeio gente que dá notícia picada. “Quando você chegar no bar te conto!” “Vá pro caralho!! Que que você ta falando?” “Começou a vender hoje ingresso pro Pixies em Curitiba, mas acabou em duas horas. “Vai se fuder!”
Desliguei, em uma hora tava no bar, o Alex me explicou a história toda. Com febre desde o carnaval em tinha ficado no boato de que o Pixies voltava, quando volto pra vida os caras já estão escalados pra tocar em Curitiba no mês seguinte. E com ingressos esgotados. Bebi as que cabiam na amizade, eu estava falido e o Alex querendo dar uma força. Do bar pro banco, cartão, senha, EMPRESTIMO, 140 merréis mais rico e endinheirado. Lan house, garoa, e-mail, ela, saudade, carinho, gostoso, te QUERO AQUI, suas pernas, meus seios, a pinta pulsando, parei, http://www.curitibapopfestival.com/ , 5 e 6, Teenage Fanclub 5, Pixies e Pin Ups 6, suor, euforia, olhei os 132 contos, a madrugada tava fria, final de fevereiro, chuva, a pinta, as pernas, a estrada, pulsando. Tinha uma semana pra descolar a diferença. Eu nem sabia de quanto era a diferença.
(...)


_ Aí Zé caralho, cenzão porra!!!
_ Vá te fude, ta achando que eu sou banco é?
_ Mano, sempre te descolo grana, gramas, quando que eu te neguei alguma coisa seu bosta? Vai entrar nessas de miguela agora é?
_ Não é miguelagem, é que não dá mesmo, Falou!
Filho da puta, desligou na minha cara.


(...)


_ E aí Mad, vamos pra Curitiba?
_Quando?
_ Esse final de semana mano, show do Pixies, to pilhado, ainda preciso levantar os ingressos.
_ Não vai rolar cara, tenho um amigo pra ver lá, mas agora não dá.
_Vá pro caralho que o Carregue então!!
Eu não queria, mas precisava desligar na cara de alguém pra relaxar.


Fui sozinho, fiz uma reserva no albergue e pronto, fui, com a grana do albergue, algum pra comer e 60 pilas pra tentar o ingresso. Cheguei na cidade umas 23h de sexta pra sábado, puta frio, como sempre, liguei pra guria da pinta. Chegando na rodoviária estavam lá ela, uma amiga muito engraçada e um cara também bem bacana. Comemos, bebemos, falamos sobre mil assuntos e eles me deixaram no albergue, depois de quase arrombar a porta do albergue pra entrar e depois passar meia hora pro cara encontrar minha reserva fui pro quarto. Dormi com a sensação de que seria um bom final de semana.
Acordei às 9h, pilhado, me vesti e fui na direção da rua das flores. Antes parei no shopping Estação, lan house, post no blog, café e voltei a seguir meu objetivo. Logo a guria me disse que não poderia me encontrar durante o dia, mas me deu o endereço de uma festa que ia rolar à noite. Não sofri, era até bom, porque eu precisava levantar aquele ingresso a todo custo.
Andei a cidade inteira, perguntei pra todo mundo e ninguém nem sabia do festival. Achei estranho e continuei. Num estúdio de tatuagem um cara me disse que o festival era daqui a um mês, mas que eles iam mudar o local, pra caber mais gente, pra ter mais ingressos. Não seria mais na Ópera de arame, e sim na pedreira. Fiquei satisfeito com a informação, só me senti meio tonto por ter errado o mês do show. Mas melhor assim, ao menos eu já conhecia a cidade.
Voltei pro albergue depois de andar o dia todo, logo na chegada encontro Hernandes, um uruguaio que mora em São Paulo com o pai, um alfaiate que tem uma loja na galeria do Rock faz 30 anos. Falamos sobre música, trocamos informações sobre a cidade e compramos algumas cervejas, tomamos na sala de TV do albergue. Era semana da moda em Curitiba, e o albergue estava cheio de garotinhas, 15, 16 anos, magras e com cara de fome, umas graças.
Ficamos ali bebendo e vendo as pequenas passarem, pelas 22h ele foi pro 92º, a casa alternativa mais conhecida da cidade. Em seguida chegou minha carona, a Morgana e minha gata de carnaval. Fomos pra festa, no norte da cidade, num bairro bacana, cheio de praças, avenidas largas, e uma balada cheia e quente. Eu já estava alucinado, cidade nova, pessoas novas, lugares novos, cerveja barata, uma gata quente e uma festa louca. Eu suava,dançava, falava, conheci dúzias de pessoas, corria pelo bar, de um lado pra outro, até cansar, e cansei, de uma hora pra outra. Dei tchau pra gata e fui andando pro albergue, atravessei a cidade de novo. As luzes da cidade, amarelas, viajando na fumaça louca, no silencio sinto essa fumaça me lavar o rosto, vivendo essa lucidez tão louco, contemplando a noite, a cidade, as pessoas, pensando no show, na guria, no mundão sambado que tava aí de pernas abertas. Cheguei no albergue e encontrei o Hernandes, mais alguns caras, cariocas, paulistas, um mineiro, um argentino, duas guriazinhas de Floripa, daquelas magrelas da semana de moda, peguei uma cerveja, um fumo, o assunto e assim ficamos até quase amanhecer.
Acordei quebrado, no albergue não tinha ninguém. Me vesti e corri pro mercado municipal, depois cerveja e X-tudo no centrão, então encontro a minha guria no shopping estação, ela parecia seria, um pouco triste de repente.
_Que que há?
_Nada, é que vou ter que ir embora daqui a pouco.
_Como assim, você acabou de chegar.
_É, mas vou ter que ir.
_Porra, vim de São Paulo e a gente mal ficou junto, pra onde tu vai?
_Vou ter que sair com a minha mãe, temos umas paradas pra comprar aí.
_Então tu vai pra casa?
_É _ Disse ela encabulada.
_Vou contigo então, já conheço o centro, quero saber onde tu mora.
_Mas, é que...
_Relaxa, não entro, vou só até a entrada, quero dar uma volta.
_Tá bom... Quer beber alguma coisa?
_Sei lá, deixa eu ver... O que que é Limonada Suissa?
_É tipo uma limonada normal, só que mais doce.
_ Mais doce como?
_ Sei lá, acho que é com leite condensado no lugar do açúcar.
_ Legal, vou dessa.
_Eu também.

Indo pra casa dela pegamos um ônibus, depois outro, e outro, não conversávamos muito, ela não parecia muito satisfeita. Na verdade eu também não estava. Entramos numa grande avenida, uma linha reta enorme, o céu estava cinza azulado, garoava, como sempre em Curitiba, o ônibus subia e descia por aquela avenida árida e irritantemente reta, ela devia ir até Londrina ou coisa parecida. Depois de um tempo descemos, tinha um supermercado com um prédio fincado no meio, entramos no prédio, um grande lobby, alguns vizinhos, boa tardes, um sofá, nos sentamos, conversamos sobre o que seria daquilo, um futuro, sei lá, sem resoluções, não parecia importante àquela hora, o vento era frio e cortava a pele, tiramos algumas fotos, demos risadas, ela subiu, eu tomei o rumo de volta. No caminho pensava em praonde ir, o que fazer daquilo tudo, eu estava a seiscentos quilômetros de casa, e tinha feito o que podia, agora tinha outro encontro marcado pra dali a um mês, quando aí sim, veria os Pixies.
Chegando de volta no albergue e lá estavam os mesmos caras, eu ainda tinha doze reais e a minha passagem. Fizemos um catado e compramos vodka, cerveja, mistura pra vodka, e fomos pro albergue, às pequenas passavam mas não se animavam a nos acompanhar, até umas nove da noite. Minha passagem era das onze e cinqüenta. Aos poucos o refeitório foi se enchendo, as pessoas foram se animando, as gurias estavam a toda, Carolina, uma gracinha de 15 anos e camiseta do nirvana era a que mais se soltava, era arrogantezinha, inteligente, bonita, com grandes olhos azuis e pernas longas e finas. A irmã estava puta da vida, corria feito louca dali pro quarto e pro lobby, reclamava, a gente só ria, Hernandes só queria encher a cara pra esquecer do frio, olhei no relógio e eram duas da matina, foda-se a passagem. Fomos de uma garrafa a outra e a mesa estava melada de refrigerante, frutas e açúcar, eu estava como gostava, rindo e ouvindo estórias mil, a magrela de repente me pega pelo colarinho e declama uma poesia, disse que ela mesma escreveu, era boa, angustiada, doída, bem 15 anos. Me derreti, me entreguei, o futuro e a tarde eram uma viagem paralela àquelas horas. Afinal de contas, eu estava na cidade mais fria da federação, com uma guria de pele fria, em cima de um balcão sujo de vodka e com a impressão de que tinha passado um ótimo final de semana na estrada.
Ouvindo:
Pixies: Broken face, something against you, isla de encanta, bone machine.

6 comentários:

Anônimo disse...

...como já disse para o A..."quem gosta de passado é museu"...

aurora disse...

"O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto."

fernando pessoa é deprimente...

Anônimo disse...

"...toda vida bem vivida tem um bom passado... a mudança de sabores é o melhor..."

aurora disse...

sem crédito?!!??!?!?!

tá, mais um...

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada
nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

Carlos Drummond de Andrade

Anônimo disse...

meus comentários são sempre para o Dono do blog, estritamente.
" A porta está fechada?
Mas no aquário de lãs tricôs camurças couros quatro consumidoras são servidas, outras quatro, cá fora, esperam vez.
Esperar resignado de quem sabe que tudo anda difícil e até os ossos do festim têm que ser disputados como pérolas."

aurora disse...

desculpe, não intencionava invadir relações e nem corromper procedimentos, só achei que poderia ser interessante.

presumirei que todos os anônimos são você...