terça-feira, agosto 07, 2007

Passageiro

Tem sempre alguém indo embora, morar em São Paulo é sempre assim, sempre tem algo acontecendo, e tudo influi na tua vida, uma hora ou outra, desde uma briga de transito, um velhinho passando mal na rua ou um avião sem freio que entra num posto de gasolina. Nas últimas semanas vi muita gente ir embora, alguns pela primeira vez, alguns que estavam só de passagem, outras se foram pra sempre. A vida nessa metrópole vem se tornando mais complicada a cada dia, pois ao passo que um vai embora, chegam cinco, pelo Tietê, por Congonhas, Cumbica no PS do Grajaú ou pelo Sírio Libanês. E o jeito é ir se apertando, se acostumando, pois não há nada que se possa fazer a respeito, definitivamente. O telefone se transforma num paliativo, um abraço digital, o computador é o portão, a janela, aberta das 9h às 16h e eventualmente aos finais de semana.

Vejo da minha janela, a de casa, as pessoas passando apressadas, de lá pra além, com casacos grossos e olhando para o chão, incomunicáveis, numa urgência que só vendo. Agora entendo o Chico Buarque quando ele disse que no Rio todos se sentem como artistas, mas em São Paulo todos, mesmo os artistas como ele se sentem como operários, parte de uma massa cinza, indistinta, correndo entre os prédios espelhados e as pichações desvendadas pela lei Cidade Limpa. E as pessoas se vão, correm por seus destinos, se desvencilham da grandeza viciante da cidade das chuvas geladas, no medo de topar com os frutos da nossa própria pressa e desatenção.

Com o tempo nos acostumamos a dar adeus, a ver as pessoas partindo e levando partes nossas mesmo a contragosto, vemos acontecer e ficamos assim, meio cão sem dono, por um tempo, cada vez menos tempo, até que não nos damos ao trabalho nem de ir até a rodoviária, ou até a porta. Pensar no que foi feito de errado é um desperdício, depois de feito não adianta mais, mas não nos furtamos a fazê-lo, em vão, já que as respostas são quase sempre inconclusivas, e perguntar pode ser ainda pior, pois a resposta dificilmente fará bem.

Sentir-se desesperadamente só numa noite fria não é um privilégio aqui, abraçar é, cantar e se olhar no espelho limpo de si, esquecer um pouco da doença e do medo, tentar se livrar desse jogo morto, do gerenciamento de performance, das notas, de devolver aquele cotidiano do qual se arrependeu em não ter conquistado, pois agora vê, e só agora, que também gosta de como isso soa.

E te sentes condenado por esta sorte do avesso, esse sentimento blindado de costelas a vibrar, depois de tanto íntimo depois tremer ao falar, não conseguir falar, fugir disso, como no dia do apagão, como na hora da valsa, da chuva e da festa, um pouco pior agora, com vergonha, com tanta dela, agora sem conseguir se ser, se estar, se permanecer, mas só se continuar, num fio cada vez mais tímido de ser, de sentir.

Cada vez mais isso me parece tolo.

Ouvindo:
Norah Jones – Rosie’s lullaby
Belle & Sebastian – This is Just a modern rock song

MDH: Preciso recuperar o “do it yourself” que existiu em mim.

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